domingo, 12 de abril de 2009

CAPÍTULO VII - O RAPTO

No dia seguinte, acordamos com um alvoroço vindo lá de fora. Carlinhos se levantou correndo e foi até a varanda.

- Droga! – exclamou ele apressado.

- O que foi? - eu perguntei sonolenta.

- Will está tripulando o Senhor dos Ventos pra voltar para o mar! Não podemos deixar ele ir embora! - disse ele vestindo suas calças.

- E por que? Não foi ele quem matou meu pai... - eu disse me sentando na cama. Carlinhos era lindo, até sendo desajeitado para vestir sua roupa.

- Do que você tá rindo? - ele perguntou sorrindo calçando suas botas e enfiando a camisa de qualquer jeito.

- Nada, você ai quase caindo por causa de uma calça. - eu disse. Ele sorriu sem graça e veio até mim de repente me dar um beijo.

- Vou pegar o Will, temos que levá-lo para esclarecer essa história com Jack! - disse Carlinhos saindo quase na mesma hora. E depois eu era a teimosa?!

Eu vesti o primeiro vestido que encontrei e fui atrás dele, mas quando cheguei no navio, eu já podia ouvir a discussão vinda da cabine. Quando eu entrei nenhum dos dois pareceu notar minha presença.

- Eu não vou! Já esclareci a história! - disse Will tentando se acalmar.

- Willian! É a única maneira de te perdoarem... - disse Carlinhos.

- Eu não preciso do perdão de ninguém! - disse Will - Sou um pirata, esqueceu? - perguntou ele prendendo seu cabelo. Eu caminhei lentamente até a grande janela de vidro no fundo da cabine. Nenhum dos dois parecia estar ciente da minha presença ainda. Eu ouvi o barulho da ancora sendo recolhida.

- Um pirata falido! - rebateu Carlinhos com raiva. Pegou pesado, eu pensei.

- Talvez, mas ainda sim sou o melhor pirata da região... - rebateu Will - vivo! - completou ele. Eu continuei olhando pela janela, daqui alguns minutos teríamos que voltar de bote para a praia. Eu abri a boca para falar, mas eles ainda não haviam me reparado ali.

- Will! Pode ser sua chance de receber o perdão real e quem sabe conseguir um trabalho de verdade! - disse Carlinhos.

- Eu não quero e não preciso de um trabalho de verdade! - disse Willian finalmente olhando para mim. - eu amo o mar, a liberdade... ser um pirata! – completou ele, e eu tinha certeza que precisaríamos de um barco para voltar para praia.

- Pense na recompensa que você receberia por ter resgatado o corpo do Rei! - disse Carlinhos. Eu juro que estava começando a fazer mímicas em relação a estarmos ficando cada vez mais longe da praia, mas Will olhou indignado para Carlinhos.

- Recompensa? Piratas não recebem recompensas! - disse Willian nervoso.

- Ah! Vocês roubam e afundam e caçam tesouros que não existem! - disse Carlinhos nervoso. Eu desisti de dizer qualquer coisa. Quando essa discussão terminasse, quem sabe estaríamos bem longe, e Carlinhos desistisse da idéia de voltar para o reino.

- Talvez não seja a maneira mais digna de se ganhar a vida, mas não troco minha liberdade por nada! - disse Willian. Eu suspirei, não adiantava tentar me intrometer. Eu continuei ali, parada olhando para o mar.

- Você está jogando uma chance e tanto fora! - disse Carlinhos desanimado. Eu podia ver a tristeza em seus olhos verdes no reflexo do vidro. Assim como eu podia ver Will balançando a cabeça com ódio. Seus olhos se cruzaram com os meus pelo reflexo do vidro e então ele estreitou os olhos e sorriu.

- Tudo bem, vou ganhar um dinheiro real, mas vai ser do meu jeito! - disse Will serio, eu me virei para olhar Will. No que ele estava pensando?! Ele me encarou sério, mas não disse nada. Apenas se aproximou alguns passos de mim.

- Como? - perguntou Carlinhos, tudo aconteceu muito de repente e a próxima coisa que reparei foi que Will me abraçava por trás e tinha uma adaga perto do meu pescoço. Eu abri a boca pra falar alguma coisa. Mas ele me interrompeu.

- Raptando a princesa! - disse Will me segurando. - 200 moedas de ouro por ela. – continuou ele enquanto eu pensava se deveria ou não me soltar, e se sim, o quanto eu devia machucar ele no meu plano de fuga.  

- 200?! - exclamou Carlinhos - É muita coisa! - completou ele, meu queixo caiu. Eu decidi que não sairia dali. Quem sabe se ele mesmo me salvasse! Mas dizer que 200 era muita coisa? 200 moedinhas valiam mais que sua noiva? Claro que meu irmão não gostaria disso, mas eu deveria valer muito mais do que 200 moedas pra ele!

- Então vou levá-la comigo! - disse Will, Carlinhos ficou me olhando! É claro que ele sabia que eu podia sair dali, mas por birra eu não ia. Ele balançou a cabeça como um sinal pra eu fazer alguma coisa, mas eu ignorei! E ignorei mesmo! 200 moedas muito?

Eu não sei quanto era isso, afinal, nunca tinha mexido com essas coisas, mas achei que eu fosse como uma obra de arte, de valor inestimável, mas se nem 200 moedinhas me pagavam, então eu ia com Will, e eu sabia que sua real intenção me seqüestrando era ir atrás de Fokke! Se Carlinhos quisesse evitar isso, ele teria que fazer Will me soltar. Afinal, EU era a donzela em perigo!

- Liv! - exclamou Carlinhos impaciente.

- Não tente nada princesa! - disse Will me apertando mais e me machucando. Definitivamente ele não sabia raptar alguém.

- Tá me machucando! - eu disse e ele relaxou um pouco.

Patético! Simplesmente patéticos! Um pirata que nem sabe prender um refém, e um noivo banana que espera que eu mesma me defenda, sendo que ele é o comandante do exercito do reino! Mas o pior, foi dizer que 200 moedas eram muito...

Will fez deu um sinal para seus homens que viessem buscar Carlinhos. É claro que ele também poderia ter fugido dos marujos, afinal, ele era capitão do exercito real, mas ele esperou algo de mim, e eu algo dele, e foi assim que nosso noivado acabou e que nós nos separamos. Meu irmão pagou as 200 moedas, eu me casei com um dos Alcantaras e vivemos infelizes para sempre!

FIM!

É claro que é brincadeira! Eu e Carlinhos nos separamos, mas isso na verdade foi só o começo.

Naquele dia, sem dizer uma só palavra Will me colocou no porão, em  uma cela que eu nem sabia que existia em seu navio. Claro que eu achei que dali a pouco ele voltaria me tirar dali, mas não foi o que aconteceu. No meio do dia seguinte Will apareceu com um prato de comida.

- Will!- eu chamei após ele ter praticamente jogado o prato na minha direção e virado das costas, ele virou-se novamente, mas não me olhou. - Será que você não pode me colocar no depósito de pólvora pelo menos? Aqui tá molhado e fedendo a peixe...

- Você é minha refém! - ele disse sério. A tentativa do Will em ser um pirata malvado não funcionava muito bem.

- Eu sei! Tudo bem! Eu não vou morrer por causa disso! – eu disse revirando os olhos. Às vezes a infantilidade dele me irritava!

- Eu vou pensar! – disse ele depois de alguns segundos de silêncio e indo embora sem dizer mais nada. O pior de tudo, era que eu não entendia o porque ele estava agindo daquela maneira... seria por causa do meu recém falido noivado? Ou de não ter ido atrás de seu irmão?

O tempo passou enquanto eu fiquei ali alimentando minha dúvida e acabei me esquecendo da comida.

- Greve de fome não funciona comigo! - disse Will saindo da escuridão que estava o porão.

- Não tô fazendo greve de fome! - eu disse sorrindo, aproveitando que era ele quem finalmente estava falando. - Só estou sem fome mesmo!

- Se quiser, daqui a pouco teremos uma sopa quente! - ele disse se apoiando nas grades. Agora sim, ele voltou ser o pirata que eu conhecia, combinava mais com ele!

- Obrigada! - disse eu sentada no monte de palha molhada, que deveria funcionar como cama para os prisioneiros que Will nunca teve.  Ele me encarou por alguns instantes e respirou fundo.

- Vamos... - disse ele abrindo a porta.

- Tudo bem Will, não vou morrer se ficar aqui! Eu já disse!

- Anda logo! Não quero você doente! - disse ele me esperando do lado de fora, eu sai e ele me guiou em silêncio até sua cabine.

- Espero que goste da nova cela! – ele disse sarcasticamente, porém parecendo um tanto desanimado.

- Você tá chateado comigo? - eu perguntei procurando pelos seus olhos, mas ele parecia entretido, brincando com as chaves em suas mãos.

- Não! – exclamou ele me encarando de repente. Ele se virou saindo da cabine. -Tome um banho quente, tem algumas roupas secas no armário se você quiser...  – ele disse parando segurando a porta. – Seu noivo ficaria uma fera se quando ele voltar te buscar, você estiver doente!

- Meu ex-noivo! - eu corrigi olhando para a aliança no meu dedo. – e SE ele vier me resgatar...

- Ah Liv!- ele suspirou - Assim como você podia ter feito algo, ele também podia ter feito alguma coisa, você era noiva dele, ele deveria ter feito algo para te salvar... mas nenhum de vocês fez, isso não necessariamente indica o fim...

- Não? - perguntei olhando para Will, tentando evitar algumas lágrimas que começaram a embaçar meus olhos.

- Tá! Eu tentei te animar, mas pra falar a verdade, nenhum de vocês realmente correu atrás, vocês são orgulhosos demais! - ele disse ainda na porta.

- Eu sei! - eu disse. Claro que sabia, só não podia admitir aquilo. Doía demais dizer que o erro também havia sido meu, e agora era tarde demais.

- Tome seu banho, e daqui a pouco trago seu jantar! - ele disse encostando a porta. E foi exatamente isso que eu fiz, tomei um banho quente e vesti uma roupa seca de Will, que ficou um pouco grande. Quando sai, lá estava ele sentado à mesa me esperando para jantar.

- Obrigada! - eu disse enquanto ele olhava alguns mapas, e apenas sorriu. - Para onde estamos indo? - eu perguntei me sentando para jantar.

- Na verdade... eu gostaria de ver isso com você! - ele disse ainda analisando os mapas. – Você sabe que eu quero ir atrás do Fokke, mas isso só será possível se você me ajudar, e se você concordar...- ele disse calmamente, eu assenti. - Eu não tenho muitos homens e você navega bem... - ele continuou, tirando seus olhos dos mapas e me encarando, eu esperei pra que ele continuasse. - Mas, caso você ache que foi uma idéia de impulso e que não vale pena, que você quer voltar pro reino, tudo bem, podemos ficar por aqui saqueando piratas falidos, enquanto ninguém vem te resgatar. - ele completou antes que eu pudesse responder.

- Se vierem me buscar... – eu disse distraída. Ele sorriu e deu com os ombros.

- Ou, eu posso te levar... – ele disse dando com os ombros.

- Estou disposta quero ir atrás de Fokke e descobrir o que aconteceu com meu pai! - eu o interrompi. Ele arregalou seus olhos negros e me avaliou por alguns segundos.

- Vai ser perigoso! - ele avisou mais uma vez, me olhando. – Ou melhor, vai ser um pouco... suicida! – ele exclamou sorrindo.

- Não tenho medo! - menti eu, enfiando uma colherada de sopa na boca.  É claro que tinha medo, mas por meu pai, eu faria qualquer coisa.

- Ótimo! - ele disse sorrindo, pegando seus mapas indo para porta. - Boa Noite então! - ele disse.

- Will! - chamei eu, e ele deu meia volta. - Você não vai dormir aqui? Eu durmo no sofá, não tem problema!- eu disse e ele sorriu.

- Não! Não posso! Carlinhos ficaria uma fera! Pode ficar com a cama mesmo.- disse ele me olhando. - Vá dormir cedo, porque amanhã será um longo dia! - ele disse fechando a porta.

O dia seguinte, realmente foi turbulento, ventava demais, e ventos instáveis, cada hora tínhamos que mudar a direção ou nos chocaríamos contra algo, eu assumi o leme, já que Will tinha poucos marujos. No final eu estava encharcada e cansada.

- Você fez um ótimo trabalho hoje! - disse Will no fim da tarde, quando o mar já estava calmo e sem ventos.

- Obrigada! - eu disse sorrindo.

- Pode deixar, eu assumo! - ele disse segurando o leme atrás de mim, e senti um arrepio quando suas mãos tocaram as minhas. - Pode ir! - ele disse sorrindo.

- Não prefere que eu fique aqui caso...

- Não! - respondeu ele antes que eu terminasse. - Desça, tem uma roupa seca pra você em cima da cama! Qualquer coisa, eu mando te chamar!- ele disse. Eu me virei pra sair, ficando cara a cara com ele, encarando aqueles olhos negros, ele não fez menção a tirar nenhum de seus braços que agora seguravam o leme envolta dos meus quadris . Ele me encarou por mais alguns segundos. Eu respirei fundo tentando me concentrar, mas era impossível com ele tão perto. Eu estendi minha mão para o tirar do caminho, mas minhas mãos tocaram seu peitoral, já que ele estava sem camisa.

Minha concentração foi pro espaço no mesmo segundo. Eu fechei os olhos e senti seu cavanhaque encostar no meu queixo, sua respiração quente em mim. Eu virei o rosto e o afastei, saindo de lá antes que pudesse acontecer alguma coisa.

Eu fui direto pra cabine, tomei um banho quente e aproveitei para tentar colocar minha cabeça em ordem. Como minha vida havia virado de cabeça pra baixo na ultima semana. Tudo havia mudado! A morte do meu pai, um noivado, um desnoivado, e agora eu estava em um navio pirata, seguindo uma rota suicida, pensando em meu noivo, mas me sentindo atraída pelo seu irmão, meu ex-namorado, ou algo parecido. A porta da cabine se abriu de repente.

- Trouxe algo pra você! - disse Will entrando com uma bandeja e deixando em cima da mesa, eu apenas sorri desanimada.

- Will... - chamei quando ele arrumava a mesa para eu comer, ele me olhou. - Você acha que seu irmão está pensando em mim?!

- Claro! - respondeu ele rapidamente.

- E por que ele ainda não veio me buscar? - eu perguntei – Ele estava minutos de distancia de nós... – eu continuei. Will sorriu calmamente e veio sentar ao meu lado.

- Você quer a resposta animadora e romântica, ou a que eu acho ser verdade, baseado no que eu conheço meu irmão...

- A verdade! - disse eu sorrindo desanimada.

- Ele vai vir te buscar! Claro! Ele te ama! Sempre te amou...Mas antes, ele vai tentar te esquecer, e quando ele perceber que não consegue, ele virá! - disse ele tentando sorrir.

- Tentar me esquecer? - eu perguntei confusa.

- Tortuga! - explicou ele. - Costumávamos ir até lá quando éramos mais jovens! - ele disse corando.

- Não acredito que vocês faziam isso! - eu disse. Uma parte de mim acreditava, afinal, eles eram homens, mas outra parte tentava me lembrar de como Carlinhos era tímido e romântico.

- Pois é! As garotas de lá adoravam meu irmão por ele ser todo tímido e romântico... - ele disse, e por um momento achei que eu devia ter pensado alto. Mas pensando bem, nestes aspectos ele não era tão tímido assim, mas era romântico!

- Você acha mesmo que ele foi pra lá? - eu perguntei não querendo ouvir a resposta, Will sorriu.

- Eu podia te enganar e falar que não! Mas eu conheço Carlinhos! Não é a primeira vez que ele tenta te esquecer! – disse Will rindo da cara que eu devo ter feito.

- Você sabia que ele gostava de mim?! – eu perguntei incrédula.

- Liv! Todo mundo sabia! – ele disse revirando os olhos.

- E você ficou comigo mesmo assim... – eu não conseguia acreditar em Will!

- Ah Liv! Nem vem com essa! – ele exclamou balançando a cabeça. – Eu tentei resistir a você, e você sabe muito bem disso...

- Você podia...

- Não! – interrompeu ele sem nem ao menos me ouvir. Nós ficamos em silêncio por alguns minutos.

- Você acha mesmo que ele... – eu comecei novamente. Will assentiu, não me deixando terminar novamente.

- Eu tenho quase certeza que neste momento ele está em Tortuga! - ele disse me encarando.

- Droga! - eu exclamei procurando afastar Carlinhos da minha cabeça. Will parecia se divertir com o meu sofrimento.

- Venha comer! E esquece isso por enquanto!- disse ele sorrindo. - Meu irmão ama você, mas ele só ficou desapontado de você não acabar logo comigo e ir com ele me entregar para seu irmão.

- Eu acho que Jack não te perdoaria! - eu disse sorrindo. - Afinal de contas, ele é o novo rei e não gosta muito de piratas! - eu disse rindo. Will riu também. Ele e Jack já haviam se encontrado algumas vezes e eles realmente não eram grandes amigos.

- Tenho certeza que ele não me perdoaria! - Will disse. - Seu irmão pode ser uma boa pessoa, mas...

- Ele prefere ficar lá e vocês piratas aqui no mar, bem longe dele! - eu disse sorrindo. E era exatamente isso, Jack não ligava muito para a pirataria, já que quase nunca eles faziam algo que afetavam o reino. Claro que isso era hoje, pois na época do pai de Will, piratas e reis eram inimigos mortais e um fazia de tudo para acabar com o outro.

- Princesa, eu vou me retirar, preciso descansar um pouco! Logo deveremos aportar, pois os estoques de água já estão no fim! - ele disse saindo da cabine. Era estranho, Carlinhos não saia da minha mente, na maioria das horas do dia, mas quando eu estava com Will, eu pensava nele, claro, mas Will me fazia sentir bem melhor, e muitas vezes eu consegui até esquecer Carlinhos por alguns instantes.

Eu passei os dias que se seguiram tentando evitar Will a todo custo. Na maior parte do dia era fácil. Já que o mar não estava colaborando muito pra nossa viagem. Eu procurava conversar com ele nos momentos em que percebia que ele estava ocupado, e no inicio da noite, quando o mar começava a acalmar eu já pedia para alguém trocar comigo, para eu poder descansar. Sem dar chance de acabarmos ficando sozinhos e cometermos algum erro.

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